Talibã assume governo do Afeganistão; entenda o conflito

A última semana tem sido de intensos conflitos no Afeganistão. Em maio deste ano, o governo dos Estados Unidos anunciou a retirada das tropas restantes no país asiático. Com a movimentação, o grupo extremista Talibã iniciou uma série de ataques a diversas províncias do país, capturando todo o território afegão. Neste domingo, 15, a capital Cabul foi tomada pelo grupo.

Contando apenas o conflito mais recente, iniciado em 2001, a Guerra do Afeganistão durou duas décadas. As origens do conflito e o surgimento do Talibã, porém, remontam 40 anos atrás.

O Talibã

O Talibã é um grupo fundamentalista que atua no Afeganistão desde os anos 1990. Com uma visão extremista da religião islâmica, a agremiação atua tanto de forma política quanto militar.

O Talibã que começou como um grupo de estudos do islã, com cerca de outros 50 estudantes, decidiu criar uma organização que militasse pelo endurecimento das leis no Afeganistão segundo uma interpretação extremista da Sharia, código de conduta islâmico. Com amplo apelo em escolas religiosas do Afeganistão e do Paquistão, em 1995 o Talibã já tinha cerca de 15 mil membros.

Entre os posicionamentos de Mohammed Omar, um dos fundadores, estavam a oposição tanto à invasão soviética, que trouxe costumes ocidentalizados ao Afeganistão, quanto às milícias que governavam partes do país após o fim da Guerra Afegã-Soviética. À época, diversas facções de mujahidins disputavam o vácuo de poder deixado pelos soviéticos, em uma guerra civil que durou de 1992 a 1996. Na visão do Talibã, os conflitos geravam sofrimento ao povo afegão, e aconteciam porque a população não seguia as interpretações mais rígidas da Sharia.

Entre 1996 e 2001, o Talibã foi o governo de fato do país, com o nome de Emirado Islâmico do Afeganistão. Após duas décadas de conflitos, entre a invasão soviética e a guerra civil, todavia, a região estava destruída, e acesso a itens básicos como água potável, comida e eletricidade dependiam de ajuda humanitária. Com uma política de desconfiança em relação a não-muçulmanos, o Talibã dificultou ou impediu ações de organismos internacionais no país.

Durante seu governo, o Talibã firmou parceria com a organização terrorista Al-Qaeda. O grupo criado por Osama Bin Laden teve grande integração com as forças de segurança do Afeganistão no período, auxiliando o governo do Talibã a manter a autoridade no país mesmo com o colapso social.

Retomada do Afeganistão

Após o ataque da Al-Qaeda às Torres Gêmeas, em 2001, o governo dos Estados Unidos, em conjunto com outros países, invadiu o Afeganistão, dando início à chamada “Guerra ao Terror”. A ofensiva foi intensa e, em cerca de dois meses, o governo do Talibã havia sido deposto.

Ao longo das duas décadas seguintes, tropas estadunidenses se mantiveram na região. Apesar de ter gasto mais de 1,5 trilhão de dólares nestes conflitos, sendo mais de US$ 1 trilhão somente no Afeganistão, o governo dos Estados Unidos nunca conseguiu remover totalmente a influência do Talibã no país.

Até 2014, as tropas estadunidenses estavam envolvidas diretamente em combates com remanescentes do Talibã no Afeganistão. Em outubro daquele ano, porém, o papel do exército dos Estados Unidos se tornou de treinamento e apoio logístico às forças armadas do Afeganistão, reunidas em 2011.

A partir de então, o Talibã passou a se reorganizar para não apenas reagir em combate contra as tropas estadunidenses, voltando a usar táticas políticas e militares para se reerguer. Em fevereiro de 2020, já com controle territorial significativo no país, o Talibã e o governo dos Estados Unidos assinaram um acordo de paz que previa o fim da ocupação estrangeira no país.

No começo de agosto, havia apenas cerca de 650 soldados dos Estados Unidos no Afeganistão. Conforme o Talibã capturava mais regiões do país, o exército afegão permaneceu com apenas dois pelotões, ambos na capital Cabul. Com pouca resistência, o Talibã aumentou a intensidade e a agressividade das ações, chegando a Cabul nesse domingo.

O presidente do Afeganistão, Ashraf Ghani, fugiu do país algumas horas antes das tropas do Talibã avançarem sobre Cabul. O grupo, que chegou aos limites da cidade na manhã de domingo (horário local), afirmou que não tomaria a capital antes de negociar uma transição pacífica do poder.

Com a fuga de Ghani, porém, o Talibã decidiu entrar na cidade. Em comunicado, o grupo afirmou que a mudança de posição aconteceu para “evitar o caos e os saques”, uma vez que a polícia local abandonou os postos.

Na incursão, as tropas do Talibã capturaram prisões em Cabul e na cidade vizinha de Bagram, libertando milhares de prisioneiros. Entre os libertos, há membros do Daesh e da Al-Qaeda. Na noite de domingo, o Talibã chegou ao palácio presidencial, e declarou a retomada do governo deposto em 2001.

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